Em 1323, tomada por grande fervor
religioso, D. Isabel, a rainha santa (1271-1336), casada com o rei de
Portugal, D. Diniz, decidiu celebrar a festa do Espírito Santo
coroando simbolicamente um imperador e dois reis. Após a cerimônia,
o “império do Divino” saiu às ruas ao som de trombetas e
acompanhado por uma multidão. Começava ali uma longa tradição de
celebrações religiosas que resiste até hoje.
No Brasil, as festividades do Divino
Espírito Santo praticamente desapareceram das grandes cidades. Há
alguns séculos, no entanto, eram realizadas nos maiores centros
urbanos coloniais e causavam tamanho envolvimento da população que
chegaram a preocupar as autoridades, como uma ameaça à ordem
pública.
Os primeiros registros dos festejos em
terras brasileiras são do século XVIII. Sob o título "Livro das
sortes que se tiraram na igreja Matriz da vila de Itu/SP para festejos
do Divino Espírito Santo (1765-1799)", estão relatadas, ano após
ano, todas as providências para o evento, como as contribuições em
dinheiro para missa, o sermão e a música, e doações de alimentos
(carne, trigo, farinha, arroz, azeite, ovos etc.).
Em 1765, por
exemplo, foram arrecadadas em Itu/SP, cerca de 150 quilos de carne.
O documento também lista os devotos escolhidos para compor os
personagens da festa. Havia o imperador, o capitão da guarda, o
pajem do estoque (provavelmente responsável pela guarda e
distribuição de alimentos), o alferes da bandeira, entre outros.
Um dos elementos que mais chamam a
atenção nas festas é a ocorrência do “tempo alegre”, prática
marcada pelas inversões simbólicas da ordem social, em que crianças
ou adultos eram coroados como imperadores do Divino. Antes disso,
havia a saída das folias, momento em que grupos de devotos
percorriam as ruas em busca de esmolas para a festa portando
bandeiras vermelhas com pombinhas bordadas em branco, símbolo do
Espírito Santo.
Os agentes da Coroa temiam que a
brincadeira virasse realidade, que a festa lúdica acabasse
inspirando revoltas efetivas. Era, portanto, preciso impedir o
envolvimento desta população com os rituais de alteração
simbólica da ordem e da hierarquia social, característicos daquelas
festividades.
Após a emancipação política
(1822), aumentou a tolerância das autoridades urbanas com os
festejos. Porém, em nome dos ideais de “progresso e civilização”,
os imperadores e suas pombas brancas do Divino tornaram-se figuras
raras nas grandes cidades.
Fonte: Revista de História
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